O São João passou, mas algumas questões ficaram.
Eu, em Itambé, no sudoeste baiano, fui iniciado, ainda criança, na arte de dançar e apreciar um bom forró. Forró para todos. Esse estilo musical tipicamente nordestino que faz com que famílias se reúnam em torno de uma fogueira e de mesas repletas de deliciosas iguarias. Ainda criança, minha avó Domiciana organizava com dedicação nossa festa de São João e, durante alguns dias, filhos, genros, noras, netos, sobrinhos, vizinhos e quem mais quisesse estavam convidados a festejar e celebrar com alegria esta data tão querida aos itambeenses. Um período de encontro e reencontro.
Mas, assim como o próprio estilo musical, a festa também vem sofrendo transformações, às vezes transformações não muito boas. E eu não estou sendo saudosista, simplesmente gostaria que muito da essência desta tradição fosse mantida, com o intuito de estabelecer um diálogo mais harmônico com as referências atuais. O “novo” e o “velho” andando de mãos dadas. Assim a festa evoluiria, se transformaria, mas não perderia o que de mais sedutor ela tem: o poder de aproximar pessoas!
Vários anos se passaram, hoje já sou homem feito e vi muitas mudanças nesta vida. Relacionadas ao São João eu vi a festa mudar de lugar, sair da praça Municipal e ir para a Praça San Filli, uma espécie de arena festiva da cidade, vi surgir o forró de duplo sentido, vi instrumentos como guitarra, baixo, teclado e bateria serem incorporados, vi surgir a febre do forró eletrônico, o surgimento do forró universitário, uma tentativa de retomar a qualidade do estilo musical, que depois foi se transformando no que a mídia chama de “verdadeiro forró pé de serra”. Vi surgir o tecno brega e o arrocha. Vejo a festa ser privatizada como o carnaval já é, com a criação de “festas de camisa” em locais fechados e pagos. Toda essa “salada”, toda essa “evolução”, nós podemos encontrar nas praças onde as grandes festas de São João acontecem nas cidades da Bahia. Mas uma coisa está cada vez mais difícil de encontrar: o velho e bom forró tocado simplesmente por um trio (triângulo, zabumba e sanfona). E olha que Itambé tem forrozeiros dos bons. E olha que em Itambé tocar Sanfona deveria ser disciplina obrigatória nas escolas!
Desde que retornei a Itambé em 2010 para fazer a pesquisa de campo do Mestrado, no qual utilizei o teatro como ferramenta para analisar questões da história e da cultura local, me deparo com essas questões ligadas à tradição. Vários entrevistados se mostraram insatisfeitos com o rumo que a festa estava tomando e, na festa de 2011, percebi que eles tinham razão. A forma mercadológica e comercial tomou conta da festa e tudo é preparado a portas fechadas, sem consultar a população, pensando apenas em uma fatia destes consumidores: os jovens. Mas, penso que, por outro lado, é realmente com os jovens que devemos nos preocupar. Quem vai levar adiante, quem vai manter viva e vibrante essa festa?
Este ano um importante fenômeno aconteceu em Itambé. Descontentes com a programação da festa oficial na Praça San Filli, muitos moradores organizaram suas próprias festas. Famílias e amigos se organizaram, fecharam ruas, decoraram tudo, armaram fogueiras, prepararam comidas e bebidas e, ali sim, encontramos o forró que estávamos à procura. Gente simples, festa simples, mas com alegria para dar e vender. Lindo ver pessoas de todas as gerações reunidas; revigorante presenciar este ato de comunidade. Uma esperança de que o novo e o velho podem, sim, andar juntos. No início da década de 50 do século passado, Luiz Gonzaga era tão pop quanto Mastruz com Leite ou qualquer outra dessas bandas, quem sabe até mais, já que o Gonzagão arrebatou corações, independente de classe social e para além do gueto. É um crime que essa juventude não conheça a poesia sonora de Luiz Gonzada, Marinês, Alcymar Monteiro, Jorge de Altino, Dominguinhos e também a garra de Zé de Sula dos Oito Baixos, Carlinhos do Acordeon, Cello Costa e tantos outros.
Confira agora um vídeo realizado durante uma festinha na casa de um dos vizinhos de Manoel. Sábado de manhã, 25 de junho de 2011.
quinta-feira, 7 de julho de 2011
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Gracas a Deus tivemos mais um Sao Joao onde tudo ocorreu bem, nada melhor do que cultura para mover o mundo, muito bonita a matéria Marcelo, fotos super profissionais e descricao maravilhosa para descrever o que a nossa terra tem de bom para oferecer!
ResponderExcluirÉ isso ai Nicky, Itambé tem muito a oferecer, só precisamos "iluminar" mais o que está escondido colocando alguns artistas no foco da festa.
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