Diário de bordo

Meus queridos e queridas, este blog foi criado para ser o diário de bordo da pesquisa de campo para meu Mestrado, junto ao Programa de Pós Graduação em Artes Cênicas da Universidade Federal da Bahia, com o apoio do CNPq. O trabalho intitulado "Pedra Afiada - Um convite para o teatro invadir a cidade" foi orientado pela Prof. Dra. Angela Reis. A pesquisa de campo foi realizada em Itambé, no sudoeste da Bahia, de março a agosto de 2010, onde alimentei este blog com informações e reflexões sobre a pesquisa e a escritura da dissertação. Depois de concluido o Mestrado (março/2011) o blog será utilizado como forma de divulgar e refletir os andamentos da cultura na cidade de Itambé. Esta é uma forma também de discutir a cultura em cidades de pequeno porte do interior da Bahia e do Brasil. Conto com a visita de todos. Ah, uma dica, como este blog funciona como um diário, para os marinheiros de primeira viagem é melhor acompanhá-lo de baixo para cima. Então busquem o primeiro post e boa viagem!!!





sábado, 12 de junho de 2010

Marina Lira por Tide Lira


Acompanhem agora o que Tide Lira nos conta sobre sua irmã Marina Lira, filha ilustre da cidade, atriz de brilho intenso que coloriu minha infância com sonhos de que o oficio teatral era possível, de que ser você mesmo é mais interessante e buscar o que está além da aparência valia a pena. Marina é uma referência de atitude na minha vida. Muito deste trabalho é dedicado a ela. LUZ pra você Marina! Onde quer que você esteja, esteja comigo, me faça companhia.


“Marina...Marina...foi...a primeira pessoa importante que eu conheci. Tirando o fato de ser irmã, ela foi a primeira pessoa, que quando criança, a gente via como importante. Eu queria ter a força da Marina. Ela batalhou, ela saiu só, ela correu atrás. Ela, como todas nós, morava na fazenda e ela um dia disse pra minha mãe que ela iria sair de Itambé e ela ia ser uma pessoa famosa. A resposta de minha mãe foi que ela não iria conseguir porque ela não conhecia ninguém lá fora. Ela fez, ela foi embora. Ela estudou, trabalhou em casa de família para ter abrigo, para ter teto e foi trabalhar. A Marina, ela retornou (depois de um tempo) para Itambé com uma visão totalmente diferente das pessoas daqui.

Ela trouxe o primeiro livro polêmico para essa cidade, para as pessoas lerem e se escandalizarem mesmo. Chegou um momento que ela queria poder tomar essa cidade para que ela transformasse isso aqui. Acho que ela é uma incógnita que vai ficar nessa cidade porque ela conseguiu ao mesmo tempo trazer tudo e não conseguiu fazer com que isso permanecesse. Chegou um momento que era demais para ela. Mas ela estava sempre ali batalhando e, aqui em Itambé, poucas pessoas sabem quem é Marina Lira. Fora de Itambé a Marina é conhecida e aqui, infelizmente, ela não tem esse reconhecimento. Justamente porque as pessoas se tapavam em relação a ela. Tinha uns que admiravam por causa da arte, mas tinham outros que a apontavam por achar que artista era tudo porra louca, que a influência da Marina era negativa. Ela era na dela, e aqui em Itambé, embora todo mundo a apontava, ela vivia aquilo que ela achava que era certo, que fazia bem para ela. A morte dela foi precoce porque foi quando ela começou, realmente, a desenvolver muita coisa, quando a vida dela já tava bem estruturada. Ela morreu aos trinta e quatro anos. Em dois meses depois de se descobrir um câncer ela não teve tempo para fazer mais nada então ela foi precoce em tudo. Aos doze anos ela já não morava mais aqui em Itambé. Ela dormia embaixo de uma ponte em São Paulo para fazer teatro de rua. Até a morte dela foi precoce. Se a gente procurar tem muita coisa dela que ela deixou aqui com pessoas que não souberam aproveitar o material dela. Tem muito material dela aqui perdido.
Quando ela avisava que ia vir para a cidade, Itambé parava, os bares se movimentavam porque ela tocava um pouco de violão em um local, depois em outro. Passava a noite assim. A cidade ficava ensandecida. Tinha aquelas pessoas que fechavam as portas quando ela passava, porque achavam aquilo absurdo. Eu tenho vontade de preservar a memória dela. Pouca coisa ficou na mão da família”.

(Tide Lira, Produtora de Eventos, 39 anos – irmã de Marina Lira)


P.S. 1 -Marina nasceu no dia 07 de junho de 1958 e morreu aos 34 anos no dia 04 de maio de 1992 e está sepultada em Itambé.

P.S. 2 - No dia de nosso encontro estava na cidade me visitando Jean Dauriac e Amós Heber.

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