Diário de bordo

Meus queridos e queridas, este blog foi criado para ser o diário de bordo da pesquisa de campo para meu Mestrado, junto ao Programa de Pós Graduação em Artes Cênicas da Universidade Federal da Bahia, com o apoio do CNPq. O trabalho intitulado "Pedra Afiada - Um convite para o teatro invadir a cidade" foi orientado pela Prof. Dra. Angela Reis. A pesquisa de campo foi realizada em Itambé, no sudoeste da Bahia, de março a agosto de 2010, onde alimentei este blog com informações e reflexões sobre a pesquisa e a escritura da dissertação. Depois de concluido o Mestrado (março/2011) o blog será utilizado como forma de divulgar e refletir os andamentos da cultura na cidade de Itambé. Esta é uma forma também de discutir a cultura em cidades de pequeno porte do interior da Bahia e do Brasil. Conto com a visita de todos. Ah, uma dica, como este blog funciona como um diário, para os marinheiros de primeira viagem é melhor acompanhá-lo de baixo para cima. Então busquem o primeiro post e boa viagem!!!





quarta-feira, 26 de junho de 2013

Tradição e modernidade



Nesse período de festas juninas grande parte das cidades do nordeste usa esses dois conceitos para definir suas festividades. Não foi diferente com Itambé, no sudoeste da Bahia, e, depois de passar os três dias de festa na cidade, me veio a pergunta: como manter uma tradição sem negar a modernidade? A cidade enfrenta um momento crítico de ajuste de contas com a mudança do governo, mas também por problemas gerados pela seca. Assim a administração não pôde pleitear verbas para a organização da festa junina deste ano. Para driblar a crise e não desapontar os moradores foi investido o mínimo possível e com isso foram organizadas festas nos bairros da cidade, o retorno a uma tradição que estava esquecida nos últimos anos, conhecida por todos por “Poeirão”. Nos dias principais da festa junina, a organização arriscou mudar o lugar da festa da Praça San Filli, uma área construída para esses festejos, para a Praça São José, correndo o risco de rejeição por parte da população. Mas foi uma ousadia que teve seus pontos positivos, como, por exemplo, concentrar mais o público e economizar em decoração e estrutura. Mas aí eu retorno ao título dessa postagem para concluir que mesmo se tratando de economia, a modernidade se faz necessária no diálogo com as tradições. É possível organizar uma festa com recursos mínimos: basta solicitar o apoio da população, fazer com que os habitantes, mesmo que poucos, se sintam responsáveis pela festa. Formar uma comissão, unir forças, dividir tarefas, trabalhar em conjunto e com vontade para que tudo dê certo. A organização da festa também precisa ser uma festa, um motivo de encontro e prazer. Depois disso, elaborar uma programação que esteja dentro desse orçamento, mas, aí sim, vem a tradição, nessa lista de atrações é preciso que a boa música seja priorizada. Vamos deixar arrochas e axés para as inúmeras festas particulares que existem por aí. Na rua, o povo quer mais é o bom e velho forró. Simples assim. Agora vamos à modernidade. Nenhum trio nordestino, por mais simples que seja, consegue fazer uma boa apresentação sem equipamentos dignos de som e luz, então mesmo que com baixo custo esses itens precisam de um pouco mais de investimento. Outro ponto que tirou um pouco o brilho da festa foi a divisão da cidade. Em Itambé, mesmo com o passar dos anos, os habitantes ainda se dividem em função de grupos políticos que governam a cidade e, por isso, não é de se estranhar que alguns moradores se recusem a frequentar a festa ou que outros moradores compareçam para apontar defeitos e falhas. Uma pena. A cidade poderia aproveitar esse momento para se unir, tentar acabar com esse comportamento que atravessa gerações e impede o progresso, porque não dá para uma cidade evoluir dividida, mesmo porque, seja lá quem for o governante, é para o povo e para todos que se governa. E se todos estivessem juntos, a festa teria sido melhor do que foi e essa tradição poderia estar garantida e vivida por todos. É de encher o coração de esperança quando, andando pelas ruas, percebemos que algumas famílias ainda mantêm a tradição de decorar a rua, a frente da casa, preparar a mesa farta para receber os convidados e familiares. É de lavar a alma estar na sua cidade, sentar na porta de casa com os amigos, comendo e bebendo o que foi preparado ali mesmo com tanto carinho e conversar sobre a vida. A festa propicia o encontro e isso é sempre um motivo para retornar. É preciso estimular essas ações dos moradores. Fazer a programação de uma festa como essa também não é fácil. É preciso agradar a todos: itambeenses, visitantes, jovens, adultos, tradicionalistas e modernistas, mas uma coisa é certa: não tem quem não goste do que é bem feito. E foi lindo ver todos dançando ao som de Juá da Bahia e sua banda, que, para mim, traduz o que é a boa música. Um repertório que passeia pelo que há de melhor do cancioneiro junino, mas também aliado a toques de modernidade em seus arranjos e vocais. Nesse momento da festa, estavam todos numa mesma vibração, num só ritmo, juntos fazendo daquele instante uma verdadeira festa.

O que fica dessa edição dos festejos juninos é que vale sim à pena correr riscos e apostar em algo novo, mas é preciso refletir e analisar o que pode ser melhorado já que essa administração está no começo dos trabalhos. E se assim for feito tenho certeza de que o São João do ano que vem será o mais tradicional e o mais moderno de todos os tempos. E a organização da festa desse ano pode dormir tranquila porque o possível foi feito, mas o melhor está sempre por vir!

 








 
 
 

Fotos e vídeos: Marcelo Sousa Brito 
 
 

Tradição: A tradição é um conjunto de costumes e crenças que remonta tempos antigos, praticados por nossos antepassados e transmitidos de geração em geração com o objetivo de serem preservados. Variam da cultura de cada povo e região e fazem parte de um contexto histórico-temporal, onde são aceitos e praticados pelo senso comum da sociedade. Fazem parte das tradições: lendas, mitos, práticas religiosas, danças, músicas, vestimentas, pratos típicos, brinquedos, jogos, artesanatos, decorações, histórias, valores e comportamentos. Tais conhecimentos são transmitidos de forma oral e/ou escrita.

Modernidade: tem um carácter de conquista pelo Homem moderno, da sua autonomia e da vontade de inventar e criar técnicas novas, ou seja, projetos racionalistas que têm o seu auge com a filosofia cartesiana.
Nos nossos tempos, a modernidade associada a ideias de positivismo, otimismo e fé no progresso, inspira as maiores reservas e algumas críticas por parte de alguns filósofos contemporâneos de diversas correntes de pensamento.
Fonte: Dicionário Aurélio.

Um comentário:

  1. Que a tradição exista, se faça presente, necessária em nossos tempos de progresso. Que as pessoas valorizem mais as tradições das nossas cidades do interior, que sejam mais modernas no que diz respeito de ideias e progresso. Um momento lindo como é o São João, de festejos, de alegrias não pode deixar de existir, de estar presentes nas praças, nas ruas, na vida e na alma das pessoas!

    ResponderExcluir