Março de 2010 eu desembarcava em
Itambé, minha cidade natal, localizada no sudoeste da Bahia. Lá eu realizei com
muito custo as atividades de pesquisa de campo do meu Mestrado no Programa de
Pós Graduação em Artes Cênicas da UFBA, defendido em março de 2011 com o título
“Pedra-Afiada: um convite para o teatro invadir a cidade”, dissertação
posteriormente transformada no livro “O teatro invadindo a cidade”
(EDUFBA/2012). Aqui nesse blog o leitor dessa postagem pode acompanhar todo o
desenrolar da pesquisa que tinha Itambé e seus habitantes como foco principal
da pesquisa.
Em Itambé eu vivi seis meses
intensos de entrevistas, visitas, passeios, conversas e a árdua batalha de
convencer os moradores da cidade a ocuparem os espaços públicos. Já em 2010 Itambé sofria com o esvaziamento dos espaços de convivência por conta
do abandono do poder público e da onde de violência que assolava/assola a
cidade.
O fato é que, com muito trabalho
consegui realizar algumas atividades relatadas no livro juntamente com
reflexões sobre a ocupação da cidade através de uma participação popular.
Mas como o tempo é senhor de tudo
eis que eu retorno a Itambé e vejo uma situação que aponta para um novo
horizonte.
Sábado, dia 10/12/2016, um grupo de
ativistas literalmente vestiu a camisa e saiu às ruas afim de ocupar os espaços
públicos da cidade, mais precisamente a Avenida Cinquentenário, no centro da
cidade. O grupo composto por esportistas, professores, funcionários públicos, profissionais
da área da saúde, donas de casa, profissionais liberais, crianças, idosos,
artistas e moradores do entorno deu início à ação primeiramente limpando a área
e deixando a terra pronta para um plantio de árvores e plantas ornamentais.
Nesse dia, além do plantio foram realizadas atividades físicas, artísticas e
esportivas, mas também avaliação médica, avaliação postural e a avenida foi
tomada e ocupada durante toda a manhã. Foi bom ver as pessoas unidas pensando
no bem da cidade, foi bom ver várias camadas da sociedade trabalhando juntos,
mas é preciso pensar que a luta não é fácil e reverter uma situação é bem
complexa e requer continuidade para depois de resolverem a questão da Avenida
Cinquentenário é importante pensar em outros lugares da cidade que precisam ser
ocupados e vividos. A cidade só existe no momento em que ela é vivida e para vivê-la
é preciso sair de casa e tomar as ruas sem medo. Juntos podemos tudo inclusive
acabar com o medo.
“Itambé é uma cidade recente. Não
encontramos obras de arte antigas ou modernas pelas ruas e prédios. Não temos
em seu patrimônio nenhuma grande criação da arquitetura, mas lá, nos planaltos,
montanhas e vales desta região peculiar deste Estado chamado Bahia, nós encontramos
pessoas dispostas a defender seu lugar, a aprender a conviver com a distância
dos grandes centros urbanos, mas prontas também para saber como diminui-la. Pensando
assim, os habitantes de Itambé, como os habitantes de qualquer cidade deste
imenso fundo do caldeirão chamado Brasil, querem ter os mesmo direitos e
deveres sem sair de onde estão. Eles querem continuar ali não de forma passiva,
mas como agentes de uma transformação necessária. De acordo com Lefebvre (1991,
p.47), “a cidade tem uma história; ela é a obra de uma história, isto é, de
pessoas e de grupos bem determinados que realizam essa obra nas condições
históricas”. Na definição de Lefebvre (1991, p.56), cidade é a ‘projeção da
sociedade sobre um local, isto é, não apenas sobre o lugar sensível como também
sobre o plano específico, percebido pelo pensamento, que determina a cidade e o
urbano’”.
Escolhi esse trecho do livro “O
teatro invadindo a cidade” para fechar essa postagem porque também, esse livro
foi lançado em Itambé com todas as despesas custeadas por minha pesquisa e eu
distribuí 50 livros gratuitamente. Duvido que alguém tenha lido o livro o que é
uma pena. Pena porque a leitura desse livro faria com que os itambeenses se
reconhecessem enquanto tal, possibilitaria o entendimento da atual realidade da
cidade e conheceria o ponto de vista de alguns moradores da cidade
entrevistados para a pesquisa além de conhecer as ações realizadas o que, no
mínimo serviria de inspiração para os próximos passos desse movimento de
ocupação que acaba de surgir.
É preciso se informar, alimentar
o pensamento para que ação e discurso estejam juntos e não se esvaziem com o
passar dos dias!
Eu continuo aqui, itambeense que
sou, não só de olho aberto, mas também de peito aberto para qualquer iniciativa
que priorize o desenvolvimento de minha cidade em todos os sentidos. Então
contem comigo, sigam em frente e quem quiser ler o livro nunca é tarde, peça
emprestado de quem tem e boa leitura.